sábado, 23 de maio de 2020

Confinamento. Não estamos todos no mesmo barco. Pesadelo. E o Sonho? A Saúde Mental ?

Pandemia, Confinamento
Trabalho e Saúde Individual, Familiar, Comunitária, Social, Ambiental.
Saúde Mental
Pesadelo maior que o sonho?
Não estamos todos no mesmo barco, nem no mesmo oceano,
Mas, estamos todos no mesmo Planeta.

Os interesses geopolíticos económicos parecem estar em colisão com as necessidades de âmbito social sanitário.

A colisão cria lucros, recria vírus corrupção, ganhos, benefícios geopolíticos económicos para alguns e novos vírus e mais danos sócio-sanitários para muitos mais. A ruína está ali… Que ameaça...

Sem prevenção, surgem mais vírus, mais riscos, mais danos sócio-sanitários.

Sem prevenção assaltam-se mais ganhos geopolítico económicos, por conta de quem acumula mais prejuízos, mais perdas, dos que ficam mais ameaçados, mais presos, mais confinados.

 O sonho e o pesadelo
Esperança na Mudança 

Amigo dr Luís
Quando eu era mais novo costumava, com o botão direito do rato, procurar sinónimos no Word para embelezar os meus trabalhos. Não que tivesse um vocabulário assim tão mau, só não conseguia competir com um computador. E, embora com essa ajuda eu tivesse apresentado aos meus professores uma mente mais criativa e poética - e com isso um maior apreço e uma melhor nota – a verdade é que aquela sensação de satisfação que recai sobre aqueles que vomitam, sem artifícios, aquilo que sentem, nunca me fazia sombra.
 O exercício de continência retórica pautado pelos mais obscuros adjectivos que praticava impedia-me de expor a minha humanidade no seu nível mais cru.
Desta vez quero que isso se foda. Estou sentado a escrever no apartamento onde moro em lisboa. Não tem mais de 25 metros quadrados e custa-me perto do salário mínimo.
Tem dois quartos. Um para mim outro para a minha filha. Ambos tem janelas.
Tenho uma salinha e uma cozinha que praticamente funciona como corredor para a casa de banho mais pequena do mundo.
Gosto da minha casa.
Não estou satisfeito, mas gosto.
Trabalho como guia turístico e durante anos operei para patrões.
O ano passado decidi começar o meu negócio.
Tenho mais responsabilidades, mais riscos mas se tudo corresse bem, teria mais ganhos.
Se eu há 10 anos visse a vida que tenho hoje, com toda a honestidade, estaria muito triste. Tinha 21 anos, estava na universidade e tinha uma vida pela frente cheia de desejos, ambição e talento.
Mas a verdade é que estava a dar os meus primeiros passos no período mais negro da minha vida, em que me tornei num alcoólico toxicodependente que mentia, roubava e fugia de todas as minhas responsabilidades.
Olhava para a minha família como um mealheiro à minha disposição, ignorava uma filha que precisava de um pai e alienei todas as pessoas que existiam na minha órbita. Só não assassinei ninguém porque ainda estou vivo.
Aos 28 anos decidi, depois de fugir de um hospital onde acordei.
E foi depois disso que fui procurar tratamento.
Atenção que não foi o facto de ter acordado de um coma num hospital que me fez ter uma suposta epifania. Foi o facto de isso não ter sido um momento esclarecedor que me assustou, pois, depois de ter fugido, fui comprar droga e consumir. Digamos que a minha epifania surge pela ausência de epifanias.
Se eu com 28 anos visse a vida que tenho hoje, com toda a honestidade, nem acreditaria. Seria bom demais. Sou um pai presente, sou o meu próprio patrão, tenho uma família que me ama e bons amigos. E a minha namorada é incrível.
Quando começou a quarentena até foi divertido. Via filmes com a minha namorada, lia livros com a minha filha por videochat, aprendi receitas novas e sujei pouca roupa.
Estávamos a viver algo histórico sentia eu.
Mas depois a merda começou a apertar.
Dizia-se que o mundo parou. Quem me dera que fosse esse o caso.
 Mas o mundo para mim não parou.
Continuei a ter de pagar renda.
Continuei a pagar contas.
Continuei a pagar pensão de alimentos.
Como não tinha salário nem contrato de trabalho tinha sempre um pé-de-meia para eventualidades, e quando começou a quarentena até estava orgulhoso de ter como me desenrascar.
Mas tudo tem um limite.
Nos últimos dias a realidade começou a desmoronar o bonito desenho que estava a pintar da minha situação corrente.
Tal como quando era mais novo sofria de uma procrastinação tão grave em que só começava a estudar para um exame na véspera, agora só quando estou a zeros na minha conta é que me dou conta dos problemas que vem adiante.
Estou a ter pequenos ataques de ansiedade sem qualquer manifestação exterior.
Por fora pareço uma estátua, mas por dentro sinto-me a afogar.
No meu peito, sem estar à espera, sinto um furacão. Poderia utilizar metáforas bem mais criativas, mas como referi antes não vou procurar sinónimos.
Quero manter o meu negócio, mas tenho de pagar o empréstimo ao banco.
Posso viver para um quarto em vez de um apartamento mas deixo de poder receber a minha filha.
Mantenho o apartamento, mas vendo o carro.
Mas preciso do carro para poder levar a minha filha à escola.
Será que preciso mesmo de gás?
Posso cozinhar sem fogão e com o verão a chegar posso bem tomar banho de água fria.
Pedir dinheiro emprestado aos meus próximos era uma coisa que eu fazia constantemente quando consumia.
Não quero nada voltar a essa prática. Mas vou ter de o fazer.
Dizem que estamos todos no mesmo barco mas não é bem assim.
Sinto que o conforto de alguns inibe a censura, a crítica e a desprezo.
Se eu quero trabalhar, sou um filho da puta que quer matar os idosos e os imunodeprimidos.
Se não trabalhar tenho de ir para o banco alimentar e rezar para que ninguém me reconheça ou para que nenhum canal de televisão esteja a alimentar-se da fome alheia para os olhos do conforto de alguns.
Se eu transmito qualquer tipo de preocupação para com a minha vida sou acusado de egoísmo e ganância.
E o problema é que é verdade… provavelmente estou a ser egoísta.
Mas que posso eu fazer?
Eu não tenho dinheiro. É um facto.
Já comecei do zero antes, e acredito que consigo outra vez.
Mas antes foi mais fácil porque tinha-me enterrado por más decisões minhas. Tinha feito merda e da grossa, fiz a minha penitência e não sou nenhum herói. Pequenos passos, mas com vontade.
Podia nestes últimos 3 meses feito alguma coisa diferente? Claro que sim!
Mas deixei que a minha depressão me comandasse.
Comi demasiadas bolachas e vi demasiada netflix.
Mas como ter esperança?
Dizem que vem uma segunda vaga, que se calhar não desenvolvemos imunidade, etc.
As decisões que tomei no passado, como ter apartamento, começar o meu próprio negócio, arranjar um carro, julgo que foram boas decisões. Mas, agora são as que me custam no bolso.
Tendo isso em conta como posso eu ter a força e a fé de que as decisões que posso tomar daqui em diante para me manter à tona da água não me vão enterrar mais?
Sinto-me perdido. Sem bússola. E isso não seria mau.
Deambular sem preocupações é uma delícia. Se tempo não fosse dinheiro. 
Um abraço para si
Para os outros quero ficar desconhecido.

Meu caro
És bem real, existes, e por tua indicação não escrevo teu nome, nem pseudónimo.
Bravo pela tua muito boa evolução, obrigado pela confiança, e obrigado por mais esta partilha.
A minha estima para ti e até mais logo ao telefone.
E, claro vemo-nos de novo para a semana.
Ab LP

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