sexta-feira, 23 de julho de 2010

B A S T A

BASTA

Luís Duarte Patrício

Médico psiquiatra


Basta é uma interjeição que significa, não mais, ou mais não, chega!


Quando o conhecimento não abunda, o Homem está sujeito ao que de bom houver, mas está ainda mais sujeito ao que não presta: acontece a todos os seres humanos. Acontece a quem cuida, o cuidador, a quem trata, o médico que propõe e o terapeuta que aplica o tratamento, a quem gere e decide, o gestor e decisor.


Mas quando Homem já sabe, quando a experiência ou a ciência já lhe ensinou, e quando de facto aprendeu, tem que ousar ser corajoso em vez de ser conformista, de fazer de conta que está cego ou surdo, em vez de fazer de contente e de assobiar para o ar como se não visse.


Quem não vê nâo sabe.

Mas quem já sabe e faz que não vê, faz triste figura. Não sejamos otários.


Se não estivermos atentos podemos estar a fazer o papel de ignorante ou até de farsante, sejamos cidadãos sem profissão ou sejamos profissionais, técnicos, consultores ou políticos.

E podemos fazer esse triste papel em nossa casa e na nossa família, ou em outro local, na nossa rua, na nossa freguesia, na nossa vila, na nossa cidade, na nossa região, no nosso país, no nosso continente, no nosso mundo.


Cada um faz o que faz, mas perante o que acontece e que não deve acontecer, o Homem que de facto é profissional de saúde, tem uma especial responsabilidade social.


E sendo médico aumenta essa responsabilidade perante o doente e perante a sociedade.


E perante a permissividade ou a passividade face às questões que éticamente desvalorizam a condição dos seus doentes, a condição humana, tem que ousar dizer: BASTA! Mais do mesmo não.


BASTA A


BASTA de ACIDENTES com consumoss


O profissional de saúde tem que estar sempre muito atento aos seus doentes. E na área das dependências patológicas e de comportamentos de risco para a saúde, tem que estar atento à eventualidade de um doente em tratamento recair nos consumos daninhos. Há recaídas que podem ser fatais, isto é, causa de morte.


Temos que saber ouvir o que nos diz o doente. Sabemos que diz tudo ou quase tudo.


Podemos informar melhor o consumidor, sobre o perigo que existe após um período de abstinência, de estar diminuída a sua tolerância á substancia que habitualmente consome?


Podemos informar o doente que caso consuma após um período de abstinência, apenas injecte uma pequena dose, para se defender da indesejada intoxicação aguda por sobredose?


Quantas pessoas conhecemos e que morreram nesta condição? Quantas mortes poderiam ter sido evitadas?


“Normalmente volta-se á dose onde se parou”, assim me disse um doente em tratamento, e com uma excelente evolução, comentando o facto de um seu conhecido ter morrido por consumo de heroína logo após sair do internamento numa clínica. A ânsia de consumir seria tanta que, foi a primeira coisa que fez ao sair, e foi-lhe fatal.


Em que condição teria sido feito esse internamento?


Seria de sua vontade?


Alguém imaginou ou alguém disse que iria sair de lá desintoxicado, curado?


Será que a responsabilidade do sucedido é do doente porque estava muito bem informado?


Será que para esse doente teria sido melhor outro tipo de proposta terapêutica?


BASTA A


Evitem fazer morrer”


Sugestões para prevenir que a situação piore


No mundo do livre comércio, e para a escolha de um tratamento sério, pode valer mais a opinião de uma pessoa amiga já conhecedora de respostas terapeuticas, do que qualquer publicidade paga ou a “fama” pela imprensa.


Por muito cansado que esteja com uma situação de dependência e de falta de saúde, antes de decidir aceitar um internamento, antes de fazer um contrato e um pagamento, oiça a opinião do seu médico em que confia.


Se não conhece um médico em que confie, peça a alguém em quem confie para lhe indicar dois médicos e oiça as suas opiniões.


Não acredite que fazendo um internamento para desintoxicação, vai ficar curado da dependência.


Saiba que no tratamento, e no interesse do doente, nem sempre é necessário fazer internamento?


Sabia que há vários modelos de internamento?


Partilhe esta informação:


O risco de morte acidental ou não desejada, causada pelo consumo de dose não tolerada, excessiva, está aumentado quando o consumidor sai de um período sem consumir.


Isto pode acontecer quando sai da cadeia ou do internamento na clínica, ou no hospital, ou quando regressa ao local onde antes consumia.


Com o consumo injectado numa veia, aumenta o risco de sobredose: Avise o consumidor que, por razões de saúde, é melhor evitar caldar, injectar nas veias.


Com informação, com formação, com educação para a saúde, podemos reduzir muito as mortes acidentais por consumo não tolerado na ocasião, que é excessivo


Disse-me um doente cujo amigo teve uma overdose: “Evitem fazer morrer”.



BASTA A

BASTA de VIOLÊNCIA com consumos



Talvez possamos dizer que é escandalosa, até mesmo vergonhosa, a forma como maltratamos a saúde, consumindo em excesso bebidas alcoólicas seja isoladamente ou misturadas, ou até misturadas com medicamentos ditos calmantes ou sedativos.


A agressividade praticada pelo ser humano sob efeitos destas substâncias, atinge por vezes uma dimensão vergonhosa e até criminosa.


É preciso dizer às pessoas que há comportamentos violentos que estão associados ao excesso, ao excesso dos consumos.

Há pessoas que estão sob o efeito de álcool e muitas vezes também de outros psicotrópicos, sedativos, excitantes ou perturbadores, e que por isso são responsáveis pela violência doméstica, violência na rua, violência nas estradas.


Naturalmente que muitas dessas pessoas não desejam ter acidentes. Há pessoas consumidoras que até se dizem cuidadosas ao conduzir. Mas sob efeito de substâncias aumenta a redução na capacidade de bem conduzir, de bem reagir, de reagir em tempo útil, sempre que é necessário. Aumenta pois a possibilidade de acidente.


O álcool perturba no consumidor a sua capacidade de ser bom condutor.

A cannabis perturba no consumidor a sua capacidade de ser bom condutor.

A cocaína perturba no consumidor a sua capacidade de ser bom condutor.

A heroína perturba no consumidor a sua capacidade de ser bom condutor.

Os ácidos e as pastilhas perturbam no consumidor a sua capacidade de ser bom condutor.


Se consumir, seja conduzido.





BASTA A



BASTA de BRANQUEAR consumos


Talvez possamos dizer que é escandalosa, até mesmo vergonhosa, a forma BRANQUEADA, ou quase ingénua como se consome cocaína (chamada de BRANCA ou GULOSA) em locais de diversão nocturna, muitos dos quais ditos “chiques”, segundo a palavra dos frequentadores que são consumidores.



E não se poderá dizer que estes consumidores são todos mentirosos e alarmistas ou manipuladores, e que inventam o que dizem fazer, ou o que vêm fazer por exemplo nas casas de banho.


Significa que há locais de diversão e de consumo, onde também existem áreas de consumo identificado.


Tratando-se do consumo branqueado de COCAÍNA, importa avisar que o uso desta substância, mesmo snifada, é uma grave forma de maltratar a saúde.



E ainda é piorada por aqueles que também associam bebidas com álcool a esses consumos.


Assim consomem mais álcool, porque criam mais resistência aos efeitos desagradáveis do álcool,e obviamente gastam mais dinheiro. Assim agravam as agressões à saúde.


Muitos ainda não sabem que a mistura de álcool com cocaína cria uma outra substância.


Assim esse consumidor passa a ter em circulação para além do etanol e da cocaína, o cocaetanol, substância ainda mais agressiva para a saúde de quem consome.


Um comentário:

  1. Parabéns Dr.º Luís Patrício pelo seu Blog. Está Formidável!Os conteúdos e os depoimentos são de uma eficácia enorme para a sociedade de hoje e para quem está agora a começar a estudar este ramo e a tentar proporcionar projectos futuros relacionados com os mesmos temas(toxicodependência,marginalidade e exclusão social). Ajudando deste modo a desmitificar o conceito "Droga".

    Cumprimentos,
    Aluna Lisandra =)

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