DROGA de INSUCESSO DESMASCARADO
Cada vez mais há quem não alinhe mais pela conveniência ou pela negação ou pelo disfarce
da evidência, no aumento indisfarçável do consumo de Cocaína e não só http://drogaparaquesaiba.blogspot.pt/2017/05/a-mesa-do-cafe-bica-com-cheiro-ou.html
Neste trabalho de Tânia Pereirinha Pereirinha
no Observador http://observador.pt/especiais/das-festas-de-sexo-hoje-a-francesa-charlotte-nos-primeiros-clubs-historias-de-100-anos-da-cocaina-em-portugal/
percebe-se
como em Portugal é evidente a distância que tem existido entre a verdade da conveniência e a verdade da minha e nossa realidade, bastante diferente do sucesso que desde há vários governos continua
a ser difundido pelos poderes.
Tânia Pereirinha, jornalista,
contactou-me e aceitou a minha sugestão de me acompanhar em mais uma visita ao terreno,
sem maquilhagens, para perceber o que se passa e comparar com o que se diz que
se passa. E aconteceu e publicou. Outros não publicaram.
Do trabalho de Tânia Pereirinha aqui
destaco o que escreveu referindo-se à minha participação. Sou médico psiquiatra
(não há em Portugal Especialidade , Sub-especialidade ou Competência em Adições
ou Toxicodependência, mas há quem assim aceite ser “especialista”.
O que tenho dito e escrito, tem por base o que
estudo, o que vejo e o que oiço de doentes e de seus familiares, de
consumidores e de colegas médicos e de outros profissionais que trabalham no
terreno.
Das festas de sexo hoje, à francesa Charlotte
nos primeiros clubs. Histórias de 100 anos da cocaína em Portugal
12 Agosto 2017429
Um século depois de ser introduzida em Portugal por uma francesa com
olho para o negócio, a cocaína está uma vez mais a crescer. Vê-se nas festas,
discotecas, nos cafés, nas ruas e até na água.
- 1859 –
1917. Remédio para as dores, histeria, sífilis e até azia
- 1917 –
1927. Charlotte, a primeira traficante
- 1980 –
1999. “Olha a branquinha da boa!”
- 2005 –
2017. Prostituição e “telecoca”
Pouco passa das 10h00 de uma
segunda-feira de fim de julho. Na zona das Olaias, em Lisboa, na garagem de um
prédio de habitação social cujo portão foi arrancado ninguém sabe dizer por
quem nem quando, rodeados de lixo, garrafas vazias, caricas, seringas usadas,
embalagens de preservativos intactas e sacos plásticos verdes, “Kit Prevenção
SIDA”, dois homens e duas mulheres vão conversando enquanto preparam as
primeiras doses do dia.
Sentados em sofás dispostos em L, que arrastaram do lixo para
ali, têm mais conforto do que os outros toxicodependentes que consomem em
barracas feitas de pneus, madeira e pedaços de lona ali mesmo atrás, nos
baldios do Vale de Chelas, com vista para o cemitério do Alto de São João; pelo
menos a droga não voa com o vento. Mas também sabem que não hão-de poder
resguardar-se ali durante muito tempo: “Esta semana vêm aí arranjar isto e
vamos ter de sair”, dizem, enquanto lamentam a
inexistência das salas de consumo assistido de droga que,
apesar de previstas na lei portuguesa desde 2001, não saíram ainda do papel.
No sofá mais próximo da porta, os homens — um
português, na casa dos 40 anos, e um alemão, consideravelmente mais novo –,
esticam as pratas onde vão depositar a heroína que dentro de instantes estarão
a fumar, com recurso a tubos artesanais, também prateados: “Desculpem estarmos
a fazer isto à vossa frente”, diz o português, de modos e discurso educados.
Encolhida no outro sofá, uma das mulheres prepara, em
cima de um livro de capa dura e com uma pequena espátula, as pedras de crack
que vai fumar, num cachimbo improvisado, com uma seringa partida a servir de
boquilha. É um processo rápido, basta o tempo da explicação — “Isto é
base, é cocaína cozida. A crua, que é a cocaína em pó, serve para cheirar ou
chutar, esta serve para fumar” — e o cachimbo está pronto a acender.
Vai fumando, como a outra mulher, dois anos mais nova, mas diz que também se
injeta, cocaína e heroína, o que houver. Tem 42 anos e seis filhos, quase todos
já crescidos, os menores “estão sinalizados pela Segurança Social”. De rajada,
conta que consome desde a adolescência, que já traficou, diz que chegou a estar
detida durante três anos no Equador, numa prisão sobrelotada e violenta onde
dormia com um olho aberto e de onde só saiu graças a um indulto papal. Tenta a
sorte: “Se vocês pagassem fazíamos aí uma entrevista como deve ser, podiam
filmar e tudo, desde que não aparecesse a minha cara. Já vieram aí jornalistas
que pagaram…”. Depois, como não há dinheiro, concentra-se no cachimbo.
O crack (ou
base ou free base) é mais barato do que a cocaína em pó
“Estas
são só as pessoas mais degradadas”, explica à saída da garagem o psiquiatra
Luís Patrício, especialista em patologias aditivas, fundador e diretor do
Centro das Taipas até 2008, cicerone do Observador por uma manhã, passada entre
Olaias, Lumiar e ex-Casal Ventoso.
O
que significa que há outras: em pleno 2017, a cocaína é uma droga
verdadeiramente democrática. Há os que encomendam pelo telefone e
consomem em casa, em festas regadas a champanhe; os que usam nas discotecas; e
estes, que se escondem nos bairros mais degradados, explica. Todos juntos
fizeram disparar as estatísticas dos últimos anos, diz o Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência, que põe
a cocaína no segundo lugar do pódio das drogas mais experimentadas em Portugal
(a canábis continua em primeiro), e dizem também os especialistas ouvidos pelo
Observador.
“A
meio da década de 80 começam a aparecer doentes que referem estar a consumir
cocaína. Gradualmente torna-se bastante comum o consumo de heroína e de
cocaína. Na maioria são consumidores que injectam cocaína associada a heroína —
o speedball –, mas aumenta também o uso de cocaína snifada. No início
dos anos 90, recordo-me de um doente na periferia norte de Lisboa contar que
fumava uma pedra que desconhecia e que agarrava muito. Tratava-se de cocaína
cozida, ou free base, cujo consumo se
banalizou depois no século XXI, porque baixou o preço e aumentou imenso a
oferta em locais e agentes de distribuição”, explica o psiquiatra Luís Patrício.
“Existiram
outros bairros bem conhecidos, recordo que os doentes diziam que iam à Venda
Nova, a Camarate. Foi muito conhecido, perto do aeroporto, o Bairro do Relógio,
mais longe recordo as Marianas, em Carcavelos, e o Fim do Mundo, em Cascais.
Mais para o centro de Lisboa recordo outros bairros citados pelos doentes: o
Casal do Pinto, a Curraleira e, ainda mais central, a zona de São Bento, onde
os doentes encontravam cocaína. Houve quem por lá ficasse fechado em algum
lugar, dias seguidos a consumir cocaína. Para algumas pessoas essa frequência,
a falta de cuidados e de estratégias e utensílios de prevenção esteve na origem
da contaminação por doenças infeciosas, muito piorada com a chegada do VIH,
situação que para algumas pessoas foi catastrófica”, explica Luís Patrício.
2005 – 2017. Prostituição e “telecoca”
Se
nos anos 90 o consumo de cocaína aumentou muito, na década seguinte explodiu,
sobretudo a partir de 2005 e entre a população mais jovem, quase sempre
associada também ao abuso de álcool e de canábis, diz o psiquiatra Luís
Patrício: “Com este crescimento da cocaína, instituiu-se outro hábito, misturar
cocaína com álcool, o que faz com que o próprio fígado produza uma substância,
chamada cocaetileno ou cocaetanol, que é ela própria outra droga. Ou
seja, a pessoa consome duas e fica com três. Os estragos são
maiores e o tratamento é mais difícil. Mas é um assunto que não é falado, é
como se estivesse tudo bem”.
Nos
anos a seguir à descriminalização que fez de Portugal um caso de sucesso em todo o mundo no que ao consumo de drogas diz respeito (foi no dia 1
de julho de 2001, sete meses depois de ser promulgada, que a lei entrou em
vigor), a
cocaína democratizou-se ainda mais.
Por
um lado, garante o especialista, nunca foi tão fácil de encontrá-la: “Os meus
clientes dizem que, por telefone, encomendam tudo o que é preciso, como se
encomenda uma pizza”. Por outro, nunca o consumo foi tão tolerado: “Convém a
todos. Já tive o dono de um bar a dizer-me que costumava vender uma média de x euros por noite e que, a partir do momento em que
decidiu fechar os olhos ao que se passa na casa de banho, passou a vender três
vezes mais”.
Um
grama de cocaína pode custar hoje entre 30 e 50 euros. Se há quem
consuma quando sai à noite ou quando o Benfica é campeão, como os amigos de uma
paciente de Luís Patrício, que snifaram riscos no ecrã de um telemóvel, à mesa
de um café de Lisboa, enquanto outros comiam caracóis e bebiam imperiais;
também há quem se escape do trabalho à hora de almoço para comprar, numa média
de duas vezes por semana (ou “quando há dinheiro”), como o homem de 43 anos que
encontramos nas traseiras da Rua Maria Pia, entre as novas hortas construídas
pelos moradores e as velhas salas de chuto improvisadas pelos
toxicodependentes.
De
calças de ganga e camisa branca às riscas azuis não dá sinais do estigma de que
fala Luís Patrício e que distingue grande parte dos adictos que frequentam
estas zonas mais degradadas — nem magreza extrema, nem dentição incompleta, nem
marcas de picadas na pele. “Agora estou a trabalhar na construção, ando só
na branca, não dou no cavalo”, explica, garantindo logo depois que está
perfeitamente funcional e apto para voltar ao emprego. “Antes ainda vou ali
tratar de uma multa que apanhei, por andar de mota sem carta”.
“Acompanho quatro meninas, todas mais ou
menos da mesma idade, 20 e poucos anos, que se prostituem ou prostituíram desde
o final da adolescência. Nos anos 90 era raro mas de vez em quando ouviam-se as
histórias do jovem yuppie que consumia coca e comprava uma noite com uma mulher
que também queria consumir. Agora isso é banal”
Luís Patrício, psiquiatra, especialista em
patologias aditivas
“Enquanto for assim, enquanto andarem só a brincar,
conseguem manter as vidas normais. O problema é quando deixam de conseguir, a
cocaína snifada tem um grau de aditividade, fumada tem outro maior, injetada
ainda mais. Tem um efeito tão rápido que quando falta a pessoa entra num
sofrimento que não se aguenta e tem de ir buscar mais”, considera Luís
Patrício, que garante acompanhar vários pacientes, endinheirados, que em vez de
1 ou 2 pacotes de um grama de cada vez estão habituados a comprar ovos
de cocaína. “São 20 gramas, a 30 euros cada, é fazer as contas… E depois há
as festas e os grandes eventos de música e de deporto: é muito mais comum do
que as pessoas pensam, há sempre cocaína. Ainda há um par de anos um paciente
meu, um homem bem colocado no mundo do desporto, abdicou de ir a uma grande
festa num estádio por causa disso: ‘Se for vou-me rebentar todo com a coca e o
álcool’.”
O psiquiatra
Luís Patrício visita regularmente os locais de consumo de drogas na zona de
Lisboa
A outra tendência que o psiquiatra tem vindo a
registar é ainda mais preocupante e prende-se com o consumo associado
ao sexo — ou do sexo como meio de possibilitar o consumo. “Acompanho quatro
meninas, todas mais ou menos da mesma idade, 20 e poucos anos, que se
prostituem ou prostituíram desde o final da adolescência. Nos anos 90 era raro
mas de vez em quando ouviam-se as histórias do jovem yuppie que
consumia coca e comprava uma noite com uma mulher que também queria consumir.
Agora isso é banal”, garante o psiquiatra.
Tal como aponta para um canto agora deserto nas
traseiras da Maria Pia, junto ao graffito de um cão que engole
um homem — “Da última vez que aqui estive vi ali dois indivíduos a terem
relações sexuais em troca de cocaína” –, também conta, parco em detalhes, a
história da “menina dita normal”, filha de pais divorciados, que está prestes a
completar 18 anos, começou a fumar charros aos 12, apanha bebedeiras frequentes
desde os 14, e aos 16 experimentou pela primeira vez cocaína.
“Há dois anos, esteve com três homens, um deles muito
conhecido aí na praça, num hotel de luxo de Lisboa. Hoje em dia, na Internet
encontra-se tudo, é muito fácil. A quantidade de gente que está a
consumir cocaína nunca mais acaba. E isso quer dizer que a prevenção
falhou.”
Curiosamente há
1 ano publiquei este vídeo. Mala Da Prevenção Dr Luís Patrício
PORTUGAL E AS DROGAS – 1- Salões de consumos
Quem fala mais verdades sobre drogas? Doentes ou dirigentes?
Nem sempre e nem todos os doentes mentem.
A partilha ...
Quem fala mais verdades sobre drogas? Doentes ou dirigentes?
Nem sempre e nem todos os doentes mentem.
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artigo da Jornalista Tânia
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